quarta-feira, 11 de abril de 2012

Os pais de uma criança de 2 anos diagnosticada com anencefalia (ausência de cérebro) acompanham, com a filha, o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) da ação que pede a liberação da interrupção da gravidez de feto sem cérebro.

11/04/2012 16h04 - Atualizado em 11/04/2012 17h07

Ela tem sentimentos, diz mãe sobre filha com diagnóstico de anencefalia

Pais levaram Vitória ao Supremo, que discute aborto de feto sem cérebro.
Segundo médico, ela tem parte do cérebro, mas tem 'sobrevida vegetativa'.

Do G1, em Brasília
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Marcelo Croxato e Joana Croxato, pais da menina Vitória Croxato (Foto: Natalia Godoy / G1)Marcelo Croxato e Joana Croxato, pais da menina
Vitória Croxato (Foto: Natalia Godoy / G1)
Os pais de uma criança de 2 anos diagnosticada com anencefalia (ausência de cérebro) acompanham, com a filha, o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) da ação que pede a liberação da interrupção da gravidez de feto sem cérebro.
Apesar do diagnóstico de anencefalia obtido ainda durante a gravidez segundo os pais, Vitória nasceu com um resquício de cérebro e couro cabeludo (acrania), conforme especialistas ouvidos pelo G1. Eles informaram que trata-se de uma "sobrevida vegetativa" e a mãe poderia ter pedido a interrupção da gravidez por conta do diagnóstico - confira abaixo opiniões de médicos sobre o caso.
A mãe da menina, Joana Croxato, contou que a família saiu de São Paulo para acompanhar o julgamento e afirmou que nunca pensou em abortar durante a gravidez mesmo após a confirmação da anencefalia por meio de exames. Ela afirmou não pertencer a nenhuma entidade ou grupo contra o aborto.
"Ela é uma criança com deficiência neurológica e precisa de estimulação, porém ela não é um vegetal, não é uma coisa. Ela é um ser humano com sentimentos", disse.
O Supremo começou na manhã desta quarta-feira (11) o julgamento da ação que pede que seja liberada a interrupção da gravidez de feto sem cérebro. Atualmente, a lei brasileira considera o aborto como crime e não há exceção para o caso de anencéfalos. Para interromper a gravidez nesses casos, as mães precisam de autorização judicial.
Segundo Joana, a menina responde à dor, tenta engatinhar e chora quando está incomodada. A mãe disse, ainda, que a criança demonstra prazer quando se alimenta e quando recebe carinho. "Ela sorri, ela tem carinho. É amor incondicional."
O pai também disse que a menina sorri quando recebe carinho. "É uma criança muito doce, muito sensível, digna de todo amor que ela recebe."
A mãe contou que sempre conversa com outras mães na mesma situação. "Quando a mãe recebe a notícia, é um sofrimento interminável. Mas, quando se encontra uma saída, muitas mães entram em contato comigo e temos que fazer o que está ao nosso alcance porque a vida não está no nosso controle. [...] Como é possível você dar o diagnóstico de um bebê quando ainda está no útero? Você não pode dar um diagnóstico só olhando para o exame, a medicina não é dois mais dois igual a quatro sempre."
Joana disse que foi um "momento difícil" receber o diagnóstico de Vitória. "O momento mais difícil foi receber a notícia do diagnóstico, de que a Vitória tinha uma doença grave e que ela ia morrer e a gente não saberia quando que ela ia morrer e eu procurei especialistas e eles disseram que eu ia correr riscos. [...] Existem situações que a gente fica abalada, eu busquei ajuda, busquei apoio da família, apoio espiritual e é uma situação muito especial e delicada."
Opinião médica
O ginecologista Cristião Rosas, da Federação Brasileira dos Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), que também estava no Supremo, diz que o caso de Vitória não é anencefalia completa.
"A anencefalia é uma patologia totalmente incompatível com a vida extra-uterina, não tem nem a calota craniana nem o cérebro. O caso dela é outro caso, na anencefalia o diagnóstico é totalmente fechado. [...] A anencefalia não tem membrana por cima, não tem calota, não tem couro cabeludo, não tem crânio, não tem encéfalo, tem apenas tronco cerebral que mantém apenas os impulsos para batimento cardíaco e movimentos respiratórios. Não há cognição", afirmou.
O especialista em médica genética da Universidade de São Paulo (USP), Thomas Gollop, que também participou do julgamento, afirmou que, em um caso semelhante ao de Vitória, a mãe poderia pleitear o aborto por conta da anencefalia.
"É uma variante da anencefalia que também é morte cerebral e, portanto, é um caso em que o prognóstico está fechado, não há tratamento e há morte certa e em caso maior ou menor todos eles caminham para óbito, todos eles são definidos pelo Conselho Federal de Medicina como morte cerebral. [...] Entra no âmbito das mal formações incompatíveis com a vida. O caso dela ainda assim é incompatível com a vida, a morte dela é certa do mesmo jeito, é uma sobrevida vegetativa e há um diagnóstico médico seguro de morte", afirmou Gollop.
A favor do aborto
O advogado Luís Roberto Barroso, que defende os interesses da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde - entidade que pede a liberação do aborto de fetos anencéfalos no Supremo -, afirmou durante julgamento que "não é aborto" a interrupção da gravidez nesses casos. Para ele, como o feto não tem cérebro "não há vida em sentido técnico".
"A interrupção nesses casos não é aborto. Então, não se enquadra na definição de aborto do Código Penal. O feto anencefálico não terá vida extra-uterina. No feto anencefálico, o cérebro sequer começa a funcionar. Então não há vida em sentido técnico e jurídico. De aborto não se trata", afirmou Barroso durante sua sustentação oral no plenário do STF.
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, falou após o advogado no plenário do Supremo e também defendeu a liberação do aborto de feto anencéfalo. Ele concordou com a tese apresentada pela defesa da entidade.
"Na verdade, a antecipação terapêutica do parto significaria hipótese de aborto eugênico. Este pressupõe a viabilidade do feto, da vida extra-uterina, o que não se caracteriza na anencefalia", disse Gurgel.

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