domingo, 10 de fevereiro de 2013

Heróis Medievais – São Domingos e a Inquisição


Heróis Medievais – São Domingos e a Inquisição

Por   /   20 de novembro de 2008  /   1 Comentário
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A santidade da Igreja e a malícia dos homens



Um conhecido escritor agnóstico dizia que as cruzadas contra os albigenses e o extermínio dos focos heréticos no sul da França atrasaram de alguns séculos o advento do humanismo renascentista e da nova ordem de coisas que seria instaurada no mundo.
Maior elogio não poderia ser feito àqueles que, como São Domingos, contribuíram para livrar a Cristandade daquele flagelo.
É oportuno lembrar um aspecto freqüentemente deformado da personalidade do fundador da Ordem dos Pregadores, em cujos membros, ao aprovar a nova regra, o Papa Honório III, em palavras proféticas, entreviu “futuros atletas da fé e verdadeiros luzeiros do mundo”.
Queremos nos referir ao aspecto combativo da vida desse insigne santo e ao apoio dado por ele e por seus filhos à Santa Sé na repressão das heresias, pois se acha neste concurso prestado pelo piedoso apóstolo do Rosário à defesa da Verdade a principal origem das incompreensões e das injustiças que sofre por parte de muitos de seus inimigos.
A apregoada “intolerância medieval”
Com efeito, não são poucos os adversários da Igreja que, movidos pela paixão e pelo sectarismo, fazem convergir em São Domingos toda a “intolerância medieval”, nele vendo a figura sinistra do primeiro inquisidor, a mandar para a fogueira as “pobres vítimas da superstição”, e que não lhe perdoam o fato de se colocar solidário com a cruzada organizada a pedido do Papa Inocêncio III contra os albigenses.


Mostrando assim os hereges como vítimas inocentes da violência dos católicos, e classificando como um crime os métodos inquisitoriais, esses detratores de São Domingos não somente deformam a personalidade do grande santo espanhol, mas sobretudo cobrem de injúrias a Igreja e a Ordem Dominicana, a primeira por ter sido a principal responsável pela criação desses tribunais, e a segunda pelo apoio decidido que deu a essa instituição no correr dos séculos.
Tão grande e generalizada tem sido esta campanha contra o Bem-aventurado fundador da Ordem dos Pregadores, que alguns autores católicos como o Pe. Lacordaire, impressionados com ela, procuraram defender São Domingos mediante o argumento de que ele nada teve que ver com a Inquisição.
Este método apologético, mesmo no caso de conseguir isentar São Domingos de qualquer compromisso com a Inquisição, tem a seu desfavor o fato de deixar pairando no ar as acusações que, paralelamente e no mesmo sentido, são feitas à Santa Igreja e à Ordem Dominicana, mas que constituíram os tesouros mais caros ao coração do grande patriarca.
Com efeito, três foram os elementos que cooperaram na obra da Inquisição: os Soberanos Pontífices, através dos inquisidores que eles tinham o hábito de nomear entre as Ordens que formam a milícia da Santa Sé na Idade Média — os dominicanos ou frades pregadores e os franciscanos ou frades menores; os bispos ou os ordinários dos lugares, diretamente ou por seus delegados; enfim, o poder civil, que punha à disposição da Igreja o braço secular, punindo a heresia como uma ameaça à segurança do Estado.
Vivendo em plena época do advento da Inquisição, tomando parte ativa e saliente no drama da heresia albigense, teria São Domingos se mostrado alheio às medidas tomadas pela Igreja para debelar aquele terrível incêndio? E será a santidade incompatível com o mister de inquisidor?
Defesa da civilização
Foi no Concílio de Latrão, de 1179, que Alexandre III promulgou o primeiro sistema completo de repressão que a Igreja haja imaginado contra a heresia. Ora, as medidas então adotadas visavam antes de tudo os hereges que, não contentes de professar opiniões heterodoxas, subvertiam a sociedade por suas violências e propagação de falsos princípios.
Nenhuma pessoa honesta e sensata pode deixar de aplaudir o Cânon 27 do Concílio Geral de Latrão, que consagrou a legítima defesa da civilização naquela época: “Estando os brabanções, aragoneses, navarros, bascos, coteraux e triaverdinos exercendo tão grandes crueldades sobre os cristãos, não respeitando nem igrejas nem mosteiros e não poupando viúvas, órfãos, velhos e crianças, não tendo consideração nem para a idade nem para o sexo, mas derrubando e devastando tudo como pagãos, ordenamos a todos os fiéis, pela remissão de seus pecados, que se oponham corajosamente a essas selvagerias e defendam os cristãos contra esses infelizes”. São esses hereges acusados de exercer devastações nas regiões que ocupam, e se Alexandre III ordena contra eles uma cruzada, é para remediar grandes desastres, ut tantis claudibus re viribiliter opponant (Decreto de Gregório IX, v. VII, 8).
Doutrinas anti-sociais
Segundo Guiraud, que é um dos mais abalizados historiadores da Inquisição, o exame das doutrinas heterodoxas dos séculos XI e XII e a enumeração das perturbações que elas provocaram demonstra:
Jan Huss, heresiarca queimado em Praga1) Que depois do ano mil a heresia deixa de ser uma opinião puramente teológica, destinada a ser discutida no recinto das escolas, mas se transforma cada vez mais em doutrinas anti-sociais e anárquicas, em oposição não somente com a ordem social daIdade Média, mas ainda com a ordem social de todos os tempos.
2) Que essas doutrinas anarquistas provocaram movimentos subversivos e perturbações profundas no seio do povo, e que assim a heresia que as informava se transformou num perigo público.
3) Que, desde então, a autoridade temporal teve tanto interesse quanto a autoridade espiritual em combater e em destruir a heresia.
4) Que essas duas autoridades, depois de haver agido separadamente durante muito tempo — o Estado pelas condenações de seus tribunais à forca e à fogueira, e a Igreja pela excomunhão e pelas censuras eclesiásticas — acabaram por unir seus esforços em uma ação comum contra a heresia.
5) Que essa ação conjunta inspirou as decisões do Concílio de Latrão em 1179 e do Concílio de Verona em 1184.
Eis, portanto, bem delineado o caráter da Inquisição, tal como foi estabelecido pelas Decretais de Alexandre III no Concílio de Latrão e de Lúcio III no Concílio de Verona. Podemos defini-la como um sistema de medidas repressivas, umas de caráter espiritual, outras de caráter temporal, promovidas simultaneamente pelo poder eclesiástico e pelo poder civil para a defesa da ortodoxia religiosa e da ordem social, ameaçadas igualmente pelas doutrinas teológicas e sociais da heresia (Jean Guiraud, “La Inquisition Médievale”).
A Inquisição é de todos os tempos
Além das conjunturas históricas que deram origem à Inquisição, devemos pôr em relevo que essa instituição existe de modo natural e necessário, embora com nomes diferentes, em toda sociedade que deseja sua própria conservação. Como acentua Rohrbacher, toda sociedade, a menos que espose um liberalismo suicida, vigia e persegue aqueles que conspiram ou trabalham pela subversão de sua estrutura. As próprias constituições dos Estados modernos cominam penas para quem tentar derrubar a forma de governo existente, em geral a republicana.
Ora, a constituição da humanidade cristã se baseia nos princípios de que é guardiã e alma a Igreja Católica. Os povos vitalmente cristãos, impérios, reinos, repúblicas, são membros vivos dessa Igreja e vivem de sua vida. Lei fundamental da sociedade cristã — disso a que se dá o nome de Cristandade — tanto para a sua existência quanto para a sua conservação e aperfeiçoamento, é a lei católica. E se não há verdadeira civilização sem a verdadeira Religião, como diz Pio X, é claro que, defendendo a verdadeira Religião, os cristãos estão defendendo a própria causa da verdadeira civilização.
Estas verdades estavam arraigadas no espírito da sociedade medieval, sincera e coerentemente católica. Não passam, portanto, de pura declamação as acusações violentas que são freqüentemente dirigidas à Igreja a este propósito. Provam apenas a ignorância e a paixão de seus autores, que transformam em mártires da liberdade de pensamento os hereges que, por seu fanatismo, desencadearam as piores desordens na sociedade de seu tempo.
São Domingos teria sido inquisidor?
Não são raros os historiadores dominicanos que sustentam a opinião de que o fundador de sua Ordem teria sido o primeiro inquisidor. O próprio Papa Sixto V se fez eco dessa opinião na bula de canonização de São Pedro de Verona (1588).
Segundo o “Dizionario di Erudizione Storico-Ecclesiastico”, “o Pontífice Gregório IX, a pedido de São Raimundo de Penaforte, dominicano, confirmou em Tolosa o primeiro tribunal da Inquisição, já erigido por Inocêncio III, nomeando para inquisidores os religiosos dominicanos, cujo Santo Fundador havia trabalhado com feliz sucesso na conversão dos albigenses, razão pela qual o Pe. João do Gabaston escreveu numa apologia que São Domingos foi o primeiro inquisidor”.
Note-se que São Raimundo de Penaforte, que exerceu o cargo de inquisidor, entrara para a Ordem dos Dominicanos em 1222, oito meses após a morte de São Domingos. Em tão breve prazo, já teria a Ordem perdido o espírito que lhe inculcara o Santo Fundador?
Inocêncio III fez de São Domingos o primeiro inquisidorTambém Oldoino diz que Inocêncio III fez de São Domingos o primeiro inquisidor.
Outros historiadores, como Guiraud mais modernamente, por exemplo, acham que na realidade as funções de inquisidor já vinham sendo exercidas desde o fim do século XII por legados cistercienses, e quando São Domingos desempenhou esse cargo, foi em virtude de poderes que recebeu da legação cisterciense dirigida por Arnaldo de Citeaux e Pedro de Castelnau. Quando, no curso de suas pregações, impôs uma penitência e concedeu cartas de absolvição ao herege Ponx Roger, declarou agir“auctoritate domini Abbatis Cisterciensis, Apostolicae Sedis legati, qui hoc nobis injunxit officium” — pela autoridade do abade cisterciense, legado da Santa Sé, que nos cometeu este ofício. Em outro ato do mesmo gênero, São Domingos se cobre sempre da autoridade do legado, o que parece provar que não era inquisidor ele próprio, mas delegado dos cistercienses, que haviam sido encarregados pela Santa Sé da Inquisição nas terras da França meridional (Bolandistas, Acta Sanctorum Augusti, I, pp. 410-411).
Não resta dúvida, portanto, quanto ao fato de São Domingos ter tomado parte na Inquisição, seja diretamente nomeado por Inocêncio III, como afirmam alguns, seja como delegado dos inquisidores cistercienses, como pensam outros.
Um nefasto preconceito liberal
Outra balela inventada pela escola liberal é a de que não se pode conceber um santo como São Domingos, que se mostre partidário dos métodos enérgicos de repressão da heresia. Não é então legítima a reação à mão armada contra as agressões nazistas e comunistas? A própria liberal América do Norte não reage contra as tendências anárquicas dos sectários que se apelidam “testemunhas de Jeová”? Outra não era a sanha dos hereges daqueles tempos.
A Igreja não deseja a morte do pecador, mas que ele se converta e viva. A Inquisição somente condenava os hereges relapsos e contumazes. Assim, por exemplo, o inquisidor geral em França no ano de 1235, Frei Roberto, denominado o búlgaro, antes de entrar para a Ordem de São Domingos havia sido um dos hereges cátaros, que o povo chamava de búlgaros.
Para se conhecer com que rigor São Domingos encarava a heresia, basta ver como tratava esses convertidos. Para dar absolvição ao ex-herege Ponx Roger, São Domingos lhe impôs, entre outras penitências: a flagelação; a abstinência perpétua, salvo nas festas de Páscoa, Pentecostes e Natal, em que devia comer carne para mostrar que havia deixado a heresia (os cátaros se abstinham de carne); o jejum durante três quarentenas por ano; a obrigação de levar duas cruzes costuradas às suas vestes, devendo estas ser da forma e cor das usadas pelos religiosos, etc.
Diz Todesco em seu “Corso de Storia della Chiesa”, depois de apresentar o retrato que de São Domingos fez Lacordaire, segundo o qual o fundador da Ordem dos Pregadores “abria a boca somente para abençoar, o coração somente para pregar, a mão somente para um ofício de amor”: “Mas os autores mais recentes não excluem que naquele grave perigo para a sociedade religiosa, e também para a civil, Domingos haja reconhecido ser justo o extremo suplício, aplicado aos hereges convictos e obstinados” (vol. III, p. 474).
Os santos a serviço da Inquisição
É notório o absoluto concurso dado à Inquisição por São Luís IX, rei de França.
Gregório IX ordenou uma inquisição geral em Aragão e na CatalunhaEm 1226, o rei Jaime de Aragão, “a conselho de seu confessor, o dominicano Raimundo de Penaforte, pediu a Gregório IX enviar-lhe inquisidores, e pela bula de 26 de maio de 1232 o Papa encarregou o Arcebispo de Tarragona de fazer, com a ajuda dos Pregadores, uma inquisição geral em Aragão e na Catalunha”. E o mesmo São Raimundo de Penaforte, dominicano, tornando-se penitenciário e canonista da Santa Sé, escreveu um tratado do processo inquisitorial.
Ao mesmo tempo, o piedoso rei São Fernando III de Castela, primo de São Luís IX, organizava a Inquisição em seus Estados. De São Fernando III faz a Santa Igreja o seguinte elogio no dia de sua festa litúrgica: “Nele, ao lado das preocupações com as coisas do reino, brilharam virtudes régias: a magnanimidade, a clemência, a justiça, e, acima de todas, o zelo pela Fé católica, um ardoroso empenho no sentido de defender e propagar o culto religioso desta Fé católica. Isto ele realizava principalmente perseguindo os hereges, não suportando que eles se estabelecessem em parte alguma de seus domínios, carregando com suas próprias mãos a lenha para a fogueira que deveria queimar os condenados” (Breviário Romano, suppl. XXX maii).
A posição dos inquisidores tornou-se muitas vezes crítica, e os Pregadores pagaram freqüentemente bem caro pela missão que haviam especialmente recebido, de perseguir a heresia: “inquisitores haereticae pravitatis” — inquisidores da herética pravidade, conforme o título que lhes deu o Santo Padre Gregório IX. Um deles, Pedro de Verona, morreu assassinado, como também aconteceu, na mesma ocasião, nas terras do Conde de Tolosa aos inquisidores de Avignonet. Foi canonizado, e a Igreja o venera sob o nome de São Pedro Mártir.
São Pio V, antes de eleito Papa, exerceu o cargo de Inquisidor Geral na Lombardia, não mais na Idade Média, mas em plena Renascença, e empregou as mais rigorosas medidas para reprimir a heresia protestante naquela região. Escolhido para sucessor de Pio IV, manteve com grande zelo a Inquisição. Dos mais notáveis acontecimentos de todo o seu pontificado, foi sem dúvida a expedição a mão armada, que organizou contra os turcos que ameaçavam o mundo cristão.
A santidade da Igreja e a malícia dos homens
Não desconhecemos o fato de que houve abusos no exercício da Inquisição. Qual a instituição no mundo que não se acha sujeita a abusos? Alguns inquisidores foram destituídos, e até excomungados pela Santa Sé por haverem exorbitado de suas funções e se prestado a servir de instrumento do poder civil. Não foi esse, porém, um mal da Inquisição em si, mas do regalismo, do divórcio entre a Igreja e o Estado, do abuso do poder político. Sobretudo em sua fase final, vemos a Inquisição infiltrada pela maçonaria na Espanha.

Em Portugal, chegamos ao cúmulo de ver a Inquisição como instrumento nas mãos de um Pombal, outro emissário das Lojas, para perseguir a Companhia de Jesus. Devemos nos lembrar, porém, de que até os sacramentos estão sujeitos a abusos. Para dar outro exemplo, o Santo Padre Pio XII se referia aos abusos que se introduziram nas práticas litúrgicas. Vamos, por esta razão, condenar os sacramentos e a Sagrada Liturgia?
Estamos vivendo em uma época em que o espírito liberal minou praticamente toda a resistência dos católicos, deixando-os indefesos nas mãos de seus piores inimigos. Não mais existe nos países cristãos esse espírito de vigilância e de combate aos germes de dissolução religiosa e social, que deu origem à Inquisição. No entanto, conforme nos mostra Rohrbacher, no governo geral do mundo o próprio Deus tem sua Inquisição. Ele tem por toda parte agentes invisíveis, que são instrumentos de Sua Providência. Daí essas misteriosas advertências, essas coerções inesperadas ao culpado. Se este não as aproveita, se se endurece na impenitência final, é entregue aos ministros da justiça eterna, nas prisões e chamas do inferno (Rohrbacher, Histoire de l’Église, vol. 9, livro 83).
Continuemos, portanto, a ver nas instituições da Santa Igreja amorosas manifestações de sua sabedoria e da assistência que lhe é prestada pelo Divino Espírito Santo. E nas diversas Ordens Religiosas, que constituem as milícias encarregadas de pôr em prática as medidas ditadas pela Santa Sé Apostólica para realizar a obra de salvação do gênero humano, vejamos outros tantos instrumentos da Providência, dignos de nosso reconhecimento e veneração.
Fonte: http://heroismedievais.blogspot.com/

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