quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

PROMOTOR RICARDO COELHO.

Flores, estudantes e a truculencia policial
Ricardo Van Der Linden de Vasconcellos Coelho*
Doutor em Direito Público UCL Louvain / Bélgica
Email: 
rvdvcoelho@yahoo.com
Twitter: @ricardovlcoelho
A violência da ação desencadeada pela Polícia Militar de Pernambuco contra estudantes que protestavam contra o aumento das passagens de ônibus é injustificável, agrediu direitos humanos fundamentais e de cidadania, considerando que se tratava de uma manifestação legítima, pacífica e ordeira, garantida pela Constituição Federal.
Os direitos humanos são garantias mínimas do respeito que todos devemos à espécie humana. Na escala da dignidade do ser humano estão no topo, incluem os direitos políticos relativos às formas de realização da soberania popular como o direito à livre manifestação. São direitos fundamentais porque constituem a base axiológica sobre a qual se edifica o estado democrático de direito.
A polícia representa o aparelho repressivo do Estado que tem sua atuação pautada no uso da violência legítima, jamais abusiva ou opressora, sob pena do uso do direito transformar-se em abuso de direito. A polícia tem a função de manter a ordem, prevenindo e reprimindo crimes, mas tem que atuar sob a lei, dentro dos padrões de respeito aos direitos fundamentais do cidadão, como o direito à vida e à integridade física.
A polícia não existe em um Estado paralelo e imune ao ordenamento jurídico. Eventualmente terá o direito de fazer uso da força, jamais da violência. A força autorizada ao agente policial do Estado é um ato discricionário, legal e legítimo desde que proporcionalmente necessária. O policial tem o dever de exercer a autoridade concedida pela lei, sob pena de estar prevaricando, mas não pode extrapolar, sob pena de estar praticando abuso de autoridade. Prevaricação e
abuso (ou desvio) de autoridade são crimes.

A polícia, não é uma profissão em que se possa sempre utilizar soluções padronizadas para problemas padronizados que ocorrem em intervalos regulares, mas, o bom policial deve ser preparado para enfrentar situações de risco sem ultrapassar a tênue fronteira da força legítima para a violência criminosa e isso só é possível com a formação de uma polícia cidadã desde a sua base.
A violência policial é um grave problema a ser solucionado pela sociedade.
Um grave problema porque a violência ilegítima praticada por agentes do Estado, que detêm o monopólio do uso da força, ameaça substancialmente as estruturas democráticas necessárias ao Estado de Direito. Será que todos que reivindicarem direitos nas ruas devem ser espancados? Evidentemente que não, isto nem é inteligente, na medida em que só instiga uma reação social.

As práticas policiais de natureza autoritária têm acontecido independente do regime político ou do governo de ocasião, elas estão entranhadas na formação policial militar brasileira e precisam ser extirpadas. É preciso se colocar que temos uma imensa maioria de bons policiais em nossas corporações, que estão envergonhados com o ocorrido. Uma polícia cidadã anula a resistência, mas não elimina, oprime ou agride o resistente.
Só a profissionalização pode ser o antídoto desse mal. Policial violento, é policial de pouco profissionalismo, sem formação ética, que toma decisões erradas e que podem comprometer toda a corporação policial. Nunca é demais recordar que a Segurança Pública é direito e responsabilidade de todos conforme preconiza a Constituição Federal em seu art. 144.
Se um policial é capaz de transigir nos seus princípios de civilidade quando no contato com o cidadão, com estudantes desarmados e que distribuíam flores, pode-se imaginar quando em contato com os criminosos. A truculência da ação sobre os estudantes abonou a violência que os policiais deveriam eliminar, contaminou e igualou a corporação a meliantes que fazem uso da força para fins criminosos.
Que o triste episódio sirva de lição para a formação de uma polícia cidadã, que dialogue com a sociedade, respeite a cidadania e os direitos humanos.
A polícia que lançou bombas, disparou tiros e agrediu estudantes não estava preparada para nos defender. Esta polícia é temida por nós, quando deveria ser respeitada.

Uma sugestão singela: É preciso se apurar responsabilidades, proíbam por lei que policiais militares retirem seus nomes das fardas em operações de rua, precisamos identificar nossos agressores, todos nós fomos vítimas. No mais, nos devolvam a cidadania roubada, somos reféns da violência urbana.
Bombas e balas definitivamente não cabem no movimento estudantil ou em sociedades civilizadas.

*Promotor de Justiça. Professor universitário

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