quinta-feira, 15 de novembro de 2012

EXTRATO DO BLOG DE MAGNO MARTINS ;;;Tribuna do leitor: A seca velha e a dos tempos modernos

Tribuna do leitor: A seca velha e a dos tempos modernos
Machado Freire

Eu esperei que o companheiro Magno Martins chegasse perto do final de sua epopéia sobre a seca que se agiganta (como nunca) nesse querido torrão sertanejo.

Aguardei para dizer algumas coisas que muita gente não sabe. Nós vivemos e convivemos com esse drama miserável ao longo de muitas décadas. Conhecemos as duas obras literárias mais importantes que vão se eternizar e sempre estarão atualíssimas: Vidas Secas, de Graciliano Ramos e O Quinze, da guerreira Raquel de Queiroz, lá das bandas de “Iracema dos lábios de mel”, nosso querido Ceará.

Confesso que chorei copiosamente quando li O Quinze. Me envolvi tanto com o drama real da vida dos sertanejos que fiz a leitura de uma “sentada”, de um começo de noite até a madrugada. Era um 7 de setembro, em plena ditadura militar, e este fato me deixou mais revoltado ainda.

A minha revolta tinha sentido, pois o Brasil inteiro sabia da roubalheira que existia nos mega-projetos da Ponte Rio-Niterói, na interminável rodovia Transamazônica, entre outros, e nós da imprensa não tínhamos como denunciar. O pessoal do velho MDB nos passava as informações e o nosso grupo lá nos confins do Sertão não tinha liberdade e nenhum meio para denunciar os fatos à população. Tinha que ser no “boca-a-boca”.

Eu já era correspondente do Diario de Pernambuco no Sertão, cobrindo uma área enorme, que envolvia os Sertões Central, do Araripe e São Francisco. E lá vem Magno Martins com origem em Afogados da Ingazeira, terra onde meu querido Dom Francisco Austregésilo de Mesquita fazia eco com Dom Hélder Câmara, no Recife.

Mas o que existe hoje de diferente em todo esse cenário que envolve o drama mais do que secular, em termos de comunicação social e ações político-administrativas? É como se as coisas que rolaram nas décadas de 60,70, e 80 estivessem há muito mais de 50 anos de distância (em relação a tudo) dos tempos atuais. Em pouco mais de uma semana, Magno Martins fez um belo trabalho mostrando “as vidas secas” tão atuais quanto àquelas que nós vivemos nos últimos 20 e 30 anos do Século XX.

Lembro que eu e outros companheiros passávamos semanas e até meses fincados no Araripe, onde milhares de trabalhadores rurais saqueavam as feiras, “furtavam” os estoques da antiga Ceasa e isso não acontece mais porque mesmo não tendo as famigeradas frentes de emergência (onde também rolava muita safadeza), os “flagelados” de hoje recebem algumas contribuições que retiram da Caixa ou Banco do Brasil e muitos ganham um trocado como cabos eleitorais nas eleições que acontecem a cada dois anos.

As mazelas político-administrativas de outrora ainda persistem. O antigo Ministério do Interior torrou muito dinheiro em obras que nunca ficaram prontas, como o canal (que Magno precisa conhecer de perto) que ligaria o lago de Sobradinho a Afrânio, passando por Rajada (distrito de Petrolina) e deságua, por gravidade, até chegar ao Araripe. Os Coelho “vendiam”esse projeto como a redenção do Sertão.

Outros projetos também foram lançados e jamais executados. E hoje isso acontece, por exemplo, com a Transposição das águas do São Francisco, que a democracia (embora nova) nos permite avaliar de cabo a rabo, como uma obra viciada, que já deveria ter sofrido uma intervenção definitiva do Exército, como sugeriu recentemente Gonzaga Patriota.

Só uma coisa, companheiro Magno Martins, nós precisamos avaliar (não sabemos como): os comentários e previsões do Padre Cícero Romão Batista, de que um dia haveria “muito rastro e pouco pasto”. O que vemos – e você contou a história bem detalhada, não temos pasto e os rastros estão desaparecendo, pois o cenário é de tremenda e sofrida desolação com os bichos morrendo de fome e sede e a imprensa mostrando tudo , ao vivo e em cores.

No passado, saíamos de Ouricuri com destino ao Crato (CE) para enviar matérias e fotos por telefone para os jornais, rádio e TV, utilizando até postagem por avião. Era um exército de repórteres do mundo todo. O novo no Araripe era o asfalto, mas não tinha telefone.
Tudo hoje é moderno, em tempo real, mas a seca permanece velha, como um filme que não sai nunca da nossa cabeça, como um pesadelo infernal. Parabéns para você, pelo brilhante trabalho.

Machado Freire é jornalista
 Escrito por Magno Martins, às 18h33

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