quinta-feira, 29 de agosto de 2013

“A Igreja medieval num dexava nóis lê a Briba”

“A Igreja medieval num dexava nóis lê a Briba”

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Esse papo você já conhece: protestantes acusam a Igreja Católica de ter impedido o acesso dos fiéis aos textos sagrados. Segundo eles, o clero malvado da Idade Média tinha medinho de que o povo descobrisse que as doutrinas católicas não têm respaldo na Bíblia. Ok, essa é a balela. Agora vamos aos fatos!
A grande maioria dos católicos medievais não tinha mesmo acesso à Bíblia. E isso não foi culpa da Igreja. O culpado foi o Gutemberg, que demorou demais a vir ao mundo! Nasceu no final do século XIV e inventou a revolucionária prensa móvel no século XV. Se tivesse nascido alguns séculos antes, certamente as coisas seriam diferentes!
Uma Bíblia na era medieval era tão valiosa que, se um cara ganhasse uma de presente, certamente teria um xilique de contentamento. A reação seria mais ou menos assim:


xilique


Bem diferente de hoje, em que uma única gráfica pode imprimir centenas de exemplares por dia, com custos muito menores. Por isso, quase todas as pessoas que a gente conhece têm dinheiro pra comprar uma Bíblia – ainda que seja uma usada.
E enquanto o Seu Gutemberg não dava as caras neste mundo, cada Bíblia era copiada à mão, e por isso tinha um custo altíssimo. Na Idade Média, um exemplar da Bíblia levava ao menos UM ANO pra ficar pronto, às vezes bem mais, dependendo da complexidade das iluminuras (desenhos). Tudo era feito a bico de pena. Os monges não contavam nem com o mimeográfo toscão da tia da escola.
biblia_acorrentadaPra ilustrar: certa vez, São Francisco de Assis, não tendo outros bens para socorrer a pobre mãe de um dos seus irmãos franciscanos, doou a ela o único exemplar do Novo Testamento que eles tinham. Ela o vendeu e conseguiu grana suficiente para se sustentar por dois anos – dois anos! E olhem que nem era a Bíblia inteira (Fonte: SPOTO, Donald. Francisco de Assis – O Santo Relutante. Objetiva: 2010, p. 273).
A escassez e o custo das Bíblias justificavam a necessidade de acorrentá-las nos locais em que estavam disponíveis para a consulta popular: bibliotecas, mosteiros ou igrejas. As correntes não impediam a leitura, e sim o furto.
Dizem também que a Igreja não permita traduções da Bíblia pra outras línguas. Essa é uma história muito mal contada, que vamos entender melhor agora. Na Idade Média, a grande maioria das Bíblias era em latim, o idioma universal da Europa na época. A Igreja permitia, sim, que fossem feitas traduções da Bíblia para os idiomas locais (língua vernácula), mas seu acesso, em geral, era restrito. É isso que podemos concluir das normas do Papa Paulo V, publicadas em 1564:



Regra III: “…(o uso) das traduções dos livros do Antigo Testamento poderá ser concedido, a juízo do Bispo, unicamente a homens doutos e piedosos sob a condição de que tais traduções sejam usadas apenas para esclarecer a Vulgata e melhor entender a S. Escritura…”.
Regra IV: “…ouvido o pároco ou confessor, se conceda a leitura da Bíblia em língua vernácula àqueles que se possa prever retirarão de tal leitura aumento de fé e de piedade sem prejuízo algum espiritual”
- D.S., Enquirídio nº 1853s



Essas restrições ao acesso aos textos traduzidos da Bíblia tinham fortes razões de existir. Os hereges cátaros, a partir do século XII, começaram a espalhar seu veneno pela Europa usando traduções da Bíblia. Eles se aproveitavam da pouca instrução dos camponeses para “catequizá-los” com interpretações deturpadas dos Evangelhos.
E no século XIV, o padre “bauruense” John Wycliffe fez uma tradução não-autorizada da Bíblia para o inglês, que nada mais era do que um meio de propagandear suas heresias.
Foi por conta do abuso dos cátaros que o concílio regional de Tolosa (França, 1229) proibiu PROVISIORIAMENTE aos leigos a leitura da bíblia em vernáculo. A Igreja foi obrigada a tomar tal medida, para proteger o povo das enganações. Então, é bom frisar:
- essa proibição era provisória, e não proibia o acesso ao texto em latim;
- o concílio era REGIONAL, então a proibição NÃO valia para toda a Igreja.
Outro problema muito comum era que, ao se realizar a tradução, fossem introduzidos erros, que alteravam o sentido do texto. E os erros não apareciam só na tradução, mas também nos prólogos e notas de rodapé tresloucados. Por isso, a Igreja era tão cautelosa quanto às traduções.
Enfim, estudando a história, vemos que, de modo geral, a Igreja medieval não se opôs às traduções fiéis, mas somente às deturpadas. Pra quem quiser saber mais, um artigo no site Veritatis Splendor (clique aqui) mostra que na Inglaterra, do século VII ao XVII, a Igreja produziu várias traduções da Bíblia para a língua local.
O fato é que, nos primeiros séculos, a leitura da Bíblia era amplamente estimulada pela Igreja. Depois, esse impulso retrocedeu, como consequência da dura luta contra a heresia do livre exame da Bíblia (a crença de que cada cristão pode interpretá-la de modo particular). Foi preciso, mais do que nunca, orientar os fiéis a ouvir a voz dos legítimos pastores. E o foco foi dado na transmissão oral da fé (como, aliás, se dava a evangelização na igreja primitiva), muito mais do que na leitura 
bíblica.



“Quem vos ouve, a mim ouve; e quem vos rejeita, a mim rejeita; e, quem me rejeita, rejeita aquele que me enviou.”
- Lucas 10, 16


Notem que Jesus não disse: “Quem lê a Bíblia, a mim ouve”, mas sim “Quem vos ouve a mim ouve”. Então, pra entender e seguir corretamente o que diz a Bíblia, devemos ouvir os sucessores daqueles a quem Jesus deu a missão de nos ensinar.
A partir do início do século XX, com o Papa São Pio X, a Igreja entendeu que era preciso estimular novamente o povo a ler a Bíblia, em sua língua nativa. E o seu sucessor, o Papa Bento XV, seguiu essa mesma linha. Em 1920, publicou a encíclica Spiritus Paraclitus, na qual escreveu:


“45. Pelo que Nos toca, Veneráveis Irmãos, à imitação de São Jerônimo jamais deixaremos de exortar todos os fiéis cristãos a que leiam todos os dias principalmente os Santos Evangelhos de Nosso Senhor, os Atos e as epístolas dos Apóstolos, tratando de convertê-los em seiva do seu espírito e em sangue de suas veias”


É isso: leiamos a Bíblia todos os dias e, acima de tudo, ouçamos a voz daqueles que podem nos ajudar em sua correta interpretação: o Papa, seus bispos e sacerdotes.
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